segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Sentenças antigas

“Reprodução de documento autêntico de sentença proferida pelo juiz Manoel Fernandes dos Santos, em Vila de Porto da Folha, Sergipe, em 15 de outubro de 1833.

“SENTENÇA JUDICIAL: O adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant’Ana, quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra, que estava de tocaia em uma moita de mato, sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra abrafolou-se dela, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimonio, porque ella gritou e veio em assucare della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante. Dizem as leises que duas testemunhas que assistam a qualquer naufrágio do sucesso faz prova.

CONSIDERO: QUE o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para conxambrar com ella e fazer chumbregâncias, coisas que só marido della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja Catholica Romana;

QUE o cabra Manoel Duda é um suplicante deboxado, que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quis também fazer conxambranas com a Quitéria e Clarinha, moças donzellas;

QUE Manoel Duda é um sujeito perigoso e que se não tiver uma cousa que atenue a perigança dele, amanhan está metendo medo até nos homens.

CONDENO o cabra Manoel Duda pelo malifício que fez à mulher do Xico Bento, a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE. A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta Villa. Nomeio carrasco o carcereiro.

Cumpra-se e apregue-se editais nos lugares públicos.

Manoel Fernandes dos Santos Juiz de Direito Vila de Porto da Folha (Sergipe), 15 de outubro de 1833”

Não se espantem, nem julguem que o estilo seja originário do Nordeste brasileiro. Essas criatividades foram herdadas dos portugueses. Uma das mais curiosas sentenças judiciais lusitanas data de 1487, antes do descobrimento do Brasil. É condenatória de um padre namorador na cidade de Trancoso. Confiram:

“Padre Francisco da Costa, prior de Trancoso, de idade de 62 anos, será degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas publicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime que foi argüido e que ele mesmo não contrariou, sendo acusado de ter dormido com 29 afilhadas e tendo delas 97 filhas e 37 filhos. De cinco irmãs, teve 18 filhas: de nove comadres 38 filhos e 18 filhas; de sete amas teve 29 filhos e cinco filhas; de duas escravas teve 21 filhos e sete filhas: dormiu com uma tia, chamada Ana da Cunha, de quem teve três filhas, da própria mãe teve dois filhos. Total: 299, sendo 214 do sexo feminino e 85 do sexo masculino, tendo concebido em 53 mulheres.”

A pena não foi cumprida, porque El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou por em liberdade aos 17 dias de março de 1487 e guardar no Real Arquivo da Torre do Tombo esta sentença, devassa e mais papéis que formaram o processo”

Do livro Código da Vida, de Saulo Ramos.

Caraca, 299 filhos?! Como saber se nós mesmos não descendemos desse cidadão?!

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